O Rasgo
Obra minha. Eu rasguei a almofada com uma chave de fenda quando estava tentando consertar o vídeo-cassete há alguns anos atrás, e o resultado foi que no lugar de uma eu tive duas coisas estragadas em casa. O vídeo-cassete já há algum tempo deixou de marcar presença em minha estante (mais ou menos quando decidi me livrar da televisão), mas a almofada permanecia ali, esquecida em algum canto da sala, ferindo a visão periférica com uma insistência difícil de descrever, até que o seu segredo fosse revelado. Quem foi que disse que as coisas contam histórias também? Pois o que eu vi na almofada foi a minha ilusão e o meu ópio durante tanto tempo que praticamente esqueci o que era olhar para o mundo acordado. Sabe lá por que cargas d’água, um dia eu resolvi que iria escrever.
Há muitas pessoas verdadeiramente brilhantes no mundo e, se você um dia duvidar disso, é só comprar um jornal qualquer e dar uma folheada: eles estarão lá. Na seção de política ou de opinião, os campeões do malabarismo ideológico e doutorandos em castelos de carta, os papas do glamour. Lá. Na direção de grandes empresas, sendo reconhecidos por seus feitos, sendo admirados por milhões ou ficando podres de ricos de alguma maneira. Se tem uma coisa que me fascina é a constância. Incrível como algumas pessoas conseguem ser brilhantes e inteligentes o tempo todo. Nós, meros mortais, somos como a velha almofada verde com um desenho feio de um tigre e uma árvore irreconhecível. Temos um rasgo. Ponto final.
Agora, se você achar que isso é pouco, lembre-se que isso basta para condenar uma almofada ao lixo – ou uma vida dedicada à mais insossa das tentativas.
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